Conhecido como 'Índio do buraco', homem vive sozinho na floresta. Base local da Funai foi parcialmente destruída em Rondônia.
Em uma ilha de floresta de
No início de novembro, o “índio do buraco” correu o risco de ter o mesmo fim. No dia 14, quando funcionários da Funai chegaram à base instalada na terra do índio, encontraram o local todo revirado. “Derrubaram todas as prateleiras, mesas, destruíram um fogão a lenha e arrebentaram uma antena de rádio e uma bateria com as placas solares”, conta o indigenista Altair Algayer, chefe da frente de proteção aos índios isolados do vale do Guaporé.
Em uma trilha um pouco à frente da base, mais uma ameaça: sobre dois paus fincados no chão, os destruidores deixaram duas cápsulas de cartuchos de espingarda. “A gente não identificou o local para onde eles atiraram”, afirma Algayer. A Funai ainda não tem pistas de onde pode ter partido a ameaça, e pessoas próximas à região negam participação no ataque. A Polícia Federal assumiu a tarefa de investigar a autoria do crime.
Terra indígena Tanaru (com borda azul), onde vive o 'índio do buraco', é uma ilha de floresta entre fazendas. A reserva ainda está em estágio inicial de demarcação. (Foto: Sipam/Divulgação)
Fazendas vizinhas
A reserva onde vive o “índio do buraco” foi criada sobre seis fazendas diferentes, todas elas devidamente documentadas nos cartórios locais. Segundo o indigenista da Funai, fazendeiros reclamam que poderiam explorar a área com planos de manejo para retirar madeira. Como o processo para a criação da terra indígena não está concluído, os donos das terras ainda não obtiveram indenização.
Saiba mais sobre o Índio do Buraco
Idade: Entre 45 e 50 anos |
Nome: É chamado de “Índio do buraco” por que dentro de suas cabanas sempre há um grande buraco, parecido com uma cova de cemitério. |
Povo: Desconhecido. Vestígios indicam que sua família, de cerca de 5 pessoas, foi dizimada por fazendeiros em 1995. |
História: A Funai tem registro da existência dele desde 1996. No ano seguinte, ele foi visto frente a frente pela primeira vez. Ultimamente, funcionários da fundação evitam se aproximar dele, pois perceberam que o índio não quer fazer contato |
Iberê Thenório : notícia em www.globoamazonia.com
Ameaça de extermínio: ”índio do buraco “ é alvo de pistolagem em Rondônia
02/12/2009 | 12h58 | Equipe A'Uwe
O provável último sobrevivente de um povo indígena em Rondônia, conhecido como “O Índio do Buraco”, tem sido alvo da ação de pistoleiros, associados a fazendeiros locais que se sentem prejudicados com o reconhecimento jurídico de áreas de proteção à sobrevivência do índio. O posto de vigilância da FUNAI no interior da Terra Indígena Tanarú sofreu um atentado há cerca de duas semanas, constatado pela Polícia Federal em inspeção local. Foram destruídos equipamentos, sistema de radiofonia, placas solares e partes da estrutura do posto, que é uma base de monitoramento mantido pela Frente de Proteção Etnoambiental Guaporé, da Coordenação Geral de Índios Isolados-CGII/FUNAI. Também foram encontrados cartuchos de espingarda detonados, o que pode ser indicativo de que tentaram alvejar o índio. O indigenista Altair Algayer, coordenador da Frente Guaporé há mais de dez anos, declarou à reportagem da Agência Folha que “eles deixaram claro que vão atirar no índio se o encontrarem”.A Terra Indígena Tanarú , localizada nos municípios de Chupinguaia, Corumbiara, Parecis e Pimenteiras D'Oeste, foi declarada como área de “restrição ao direito de ingresso, locomoção e permanência de pessoas estranhas aos quadros da FUNAI”, e teve recentemente sua condição jurídica reafirmada por prorrogação de três anos (Portaria FUNAI nº 1371, de 27/10/2006).
O “Homem do Buraco” subsiste numa das situações mais emblemáticas dos últimos povos indígenas não-contatados na Amazônia. Único remanescente conhecido de uma etnia indígena exterminada no sudoeste do Estado de Rondônia, provavelmente entre as décadas de 80 e 90, teve sua existência comprovada a partir de 1997, quando sua passagem e sinais de habitação e locomoção foram registrados irrefutavelmente pela equipe do indigenista Marcelo Santos, da FUNAI, incluindo naquele momento o cinegrafista Vincent Carelli – registros que dariam origem ao recente e premiado documentário Corumbiara. Não se sabe maiores detalhes de sua origem, sua língua ou seu povo. Sua alcunha foi-lhe atribuída pelo mais significativo traço de sua breve permanência em algum ponto de sua dita “área de perambulação”; pequenos tapiris (cabanas provisórias de palha) dentro dos quais um buraco profundo é cavado, onde o índio se aninha. Os indigenistas consideram que o referido “buraco” tenha alguma atribuição simbólica e cosmológica de auto-proteção. De toda forma, o “Homem do Buraco” tem rechaçado continuamente a presença e aproximação de estranhos, tanto “brancos” quanto outros indígenas, como seu único e último recurso de auto-preservação. Além do atentado evidente, com contornos de genocídio, uma das prováveis conseqüências negativas imediatas é o abrupto afastamento do Homem do Buraco das áreas monitoradas e protegidas pela FUNAI, onde em tempos recentes ele já revelava alguma tolerância à presença dos agentes da Frente de Proteção, aceitando furtivamente sementes de cultivares nativos e algumas ferramentas básicas como facões ou machados.
Historicamente, testemunhos regionais relatam, por exemplo, o envenenamento coletivo por açúcar misturado a veneno para ratos oferecido por fazendeiros locais a índios da região, nos idos de 1985. Marcas de trator de esteira e numerosos cartuchos queimados sobre vestígios de aldeamentos foram verificados em anos subseqüentes, assim como cerâmica e objetos indígenas destroçados. Os Akuntsú, etnia da mesma região contatada com apenas 07 indivíduos em 1995 (atualmente, restaram cinco), apresentam indeléveis marcas dos tiros dos invasores em seus corpos. Não é coincidência que também seja conhecido por “Massacre do Corumbiara” um dos eventos mais sangrentos da história recente de Rondônia, quando dezenas de trabalhadores rurais acampados em parte da Fazenda Santa Elina, no mesmo município, foram brutalmente executados e torturados, tendo o acampamento sido incendiado por jagunços e policiais a mando dos supostos “proprietários” locais (09-08-1995), cuja truculência há décadas imperam nestes rincões de Rondônia.
Não longe dali, na Terra Indígena Omerê, habitada pelos índios Akuntsú e Kanoê – ambos pequeníssimos grupos remanescentes de massacres - a Frente Guaporé contende com o ilícito jurídico da invasão de fazenda de gado do latifundiário Carlos Schumann, que há semanas posterga ordem judicial da retirada de pessoas e gado da Terra Indígena. O último argumento do fazendeiro é que não pode deslocar seus rebanhos sem a GTA- Guia de Trânsito Animal – documento oficial emitido pelas agências estaduais de defesa sanitária animal - para cuja emissão é imprescindível a comprovação de vacinação regular do gado, exigência a qual o referido rebanho não atende. A vacinação regular atestada por veterinário cadastrado pelo estado é de responsabilidade e obrigação dos criadores, como medida de controle sanitário nacional. Carlos Schumann, que foi à imprensa local (jornal "Extra de Rondônia", em 02-10-09) “denunciar” a suposta perseguição dos indigenistas da FUNAI, que teriam “plantado índios” dentro de suas terras, é afamado em Rondônia como um dos mais violentos proprietários e madeireiros da região, tendo em seu currículo inúmeras acusações por movimentos camponeses regionais de ser mandante de assassinatos, torturas e todo tipo de práticas de intimidação pela violência.
Rondônia, que foi elevada à categoria de estado da federação apenas em 1981, tipifica a metodologia da política para ocupação da Amazônia levada a cabo por sucessivos governos militares no Brasil, que nas décadas anteriores a proclamavam como uma “terra sem homens”, para a qual era necessário alocar “homens sem-terra”. A ocupação frenética, desordenada e logo encabeçada por latifundiários oriundos do centro-sul do país, que rapidamente se assenhorearam do processo, inclusive ocupando os cargos políticos que legitimassem suas ações espoliadoras, legou ao país uma região com altíssimos índices de devastação ambiental e violência fundiária. Os habitantes originais da terra, os índios, como sempre, foram as maiores e mais violentadas vítimas deste processo, num genocídio incontável e irrefreável. Ainda o são.
Autora: Rosa Cartagenes; Apoio Mobilizado ao Povo Zo'é e Outras Etnias
Texto publicado no site AMAZOÉ.
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